domingo, 9 de dezembro de 2007

CONTRASTES

Nasci em Pedralva, uma cidadezinha mineira encrustrada na serra, com aproximadamente 11000 habitantes. Vivo em São Paulo, a maoir metrópole brasileira há 24 anos!
Sempre convivi, na infância, com pessoas simples, mesmo que cultas; pessoas humildes, mesmo que de posses; pessoas sábias, mesmo que semianalfabetas. Pessoas simplórias, sem malícia, mesmo que cercada de intenções outras.
Talvez por isto, nunca me sinta à vontade em ambientes pomposos, com luxo e trics-trics. Não me julgo melhor do que ninguém por ter um diploma de curso superior. Apenas tive a oportunidade que muitos não tiveram. Talvez por isto, tenha optado por cuidar da população menos favorecida.
Mas, devo freqüentar eventos e congressos para me atualizar e percebo o bombardeio dos grandes laboratórios tentando vender produtos aos quais os meus pacientes dificilmente terão acesso.
Somos da classe média: de manhã, tomo meu banho, preparo o café da manhã e chamo meus filhos. Pego o meu carro, deixo-os na escola ( meu marido me ajuda nesta tarefa)e vou para o trabalho. Tudo tão natural e rotineiro não é?
Não para todo o mundo!
No caminho, vou observando, e posso dizer que, de camarote, o que se passa com grande parte de nossos desprezados e abandonados brasileiros: numa esquina, homens vendendo todo tipo de mercadoria. Noutra, crianças vendendo balas e chicletes; noutra, adolescentes se debruçam sobre o pára-brisas e o lavam na esperança de uma gorjeta. Mais adiante, um deficiente físico pede esmola; outros fazem malabarismos que nos remetem, inevitavelmente, à metáfora do equilíbrio da própria vida...
E é difícil passar por essa gente e não se sentir mal, impotente, com vontade de fazer alguma coisa e não saber como começar.
Os taxistas estão circulando por São Paulo com um adesivo nos vidros com os seguintes dizeres: "Dê mais que esmola, dê futuro!"É muito bonita esta filosofia! Mas acontece que a barriga está roncando de fome agora! Já! A fome é hoje! E não dá para esperar um futuro que nem sabemos se vai chegar!
Sou católica e devo amar ao próximo como a mim mesma. Mas como é difícil!
Meu avô diria: -Se eu acertá na loteria eu vô ajudá esse povo tudo!
Dia desses eu ouvi minha mãe dizer isto também!"Tar e quar"!
No hospital em que trabalho, apesar da reforma que o deixou todo bonito, ainda há carência de muita coisa: de mão-de-obra, de assistência primária, de carinho, de disposição, de amor e de informação! Olha a informação aí de novo! Ainda ouço mães perguntarem se não é o dentinho a causa de uma febre de 40 graus! E quando se faz o diagnóstico de uma gripe ou outra virose qualquer, ouve-se da mãe incrédula:
- Mas gripe dá febre?
Tem muita coisa errada, conceitos errados que vão passando por gerações e gerações e é sempre difícil mudar um paradigma! Muito difícil!
A ciência está evoluindo sempre, freneticamente e também inversamente proporcional ao acesso à mesma pela grande maioria dos brasileiros. Se estamos vivos, como brincava um professor da faculdade(e eu já me formei há 23 anos!), é porque as doenças são quase todas auto-limitadas, isto é, têm um ciclo definido que depende apenas da imunidade de cada um. E assim, nós nos safamos delas, apesar de nós, médicos!
Recentemente, fiz um curso de atualização em pediatria no Instituto da Criança da USP e facava entristecida por constatar como as nossas crianças estão abandonadas! Alguns protocolos de atendimento ficam só no papel!
Oa atendimentos que deveriam ser feitos nas UBS( Unidades Básicas de Saúde) ou não são feitos ou são mal feitos. E a rebarba, tanto de crianças que necessitam de um atendimento de urgência, como a de mães insatisfeitas com o atendimento oferecido, vai toda para o pronto socorro e, geralmente nos plantões noturnos, pois a maioria das mães trabalha e não pode se arriscar a faltar no emprego para consultar o filho e depois ter que ficar em outra fila: a dos desempregados.
E aí, quando uma dessas mães, depois de um dia inteiro de trabalho e ônibus lotados, chega ao pronto socorro e fica horas na fila, ouve do pediatra(que também já veio cansado de outro emprego)que aquele problema do filho dela não é para ser resolvido no pronto socorro e sim na UBS!
O que você faria? Coloque-se no lugar dessa pessoa!
Algumas mães resignadas aceitam, abaixam a cabeça e saem. E provavelmente vão levar em outro PS até que alguém as ouça!
Outras não! Fazem barraco mesmo!E, às vezes, com razão!
O buraco é mais embaixo!
Se começa errado, vai errado até o fim!
E está difícil, quase impossível, vislumbrar uma solução para tanto abandono!
Vê-se tanta roubalheira no Planalto Central e filiais ...
Nossos políticos também têm muita fome!! De grana!! De poder!!
E as nossas crianças definhando também de uma fome corrosiva que acomete o corpo, a alma, a auto-estima, a dignidade! Elas crescem sem saber o que é isso! Poderemos cobrar algo dessas crianças depois?
Morrem até de catapora que é uma doença viral e prevenível por uma vacina que já existe há mais de 10 anos!!! Mas nos postos? Não, não tem!!
Lembro daquela música do Raul Seixas:..."Eu devia estar contente porque eu tenho um emprego, sou o dito cidadão respeitado e ganho 4 mil cruzeiros por mês... eu é que não me sento no trono de um apartamento com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar..."
Alguma coisa precisa ser feita! Urgente!
Eu? Não sei por onde começar!
Tento fazer meu trabalho bem feito dispensando a todos o respeito com o qual eu gostaria de contar. Ensinando e informando! Mesmo que, de vez em quando, receba uma resposta atravessada!

"Grande é a tarefa que nos espera...
para todos os seres humanos constitui quase que um dever pensar
que o que já se tiver realizado é sempre pouco em comparação com
o que resta por fazer." João XXIII

"Se um dia tiver que escolher entre o mundo e o amor...lembre-se:
se escolher o mundo, ficará sem o amor, mas se escolher o amor, com
ele conquistará o mundo". Albert Einstein

ORAÇÃO

Olha...olha este mundo...
O que ele tem pra oferecer pr'os filhos teus?
Olha..olha esta Terra...
Quanta miséria a entristecer os sonhos teus!
Olha...olha este mar...
A água impura a inundar os planos teus.
Olha...quanta amargura!
A vida escura a empedrecer os olhos meus...

Olha...olha esta geração...
A convivência com o horror...banalização!
Olha...quanta loucura!
A ditadura da democratização!

Olha...a grande solidão...
Da sociedade que quer ter...
E só tem o não!
Olha...que estrutura!
Falta a figura que lidere a união!

Mas...olha...
Olha este céu!
Cheio de estrelas a nos dizer
Que existe um Deus!
Olha...quanta ternura!
Quanta doçura!
Basta atentar aos sinais Seus...

Olha...olha teu coração...
Ele já está a se acalmar
No enlevar
Desta canção...
Desta emoção...
Desta comoção...
Desta oração... (canção feita em outubro de 2003)

Thais Rosa Bustamante-13/11/2007

Um comentário:

Luciana disse...

Tb gostaria de acertar na esportiva pra poder ajudar um pouco mais, porque com esses politiqueiros que temos tá dificir dimais da conta.